quinta-feira, 19 de julho de 2007

Gótico ou romantico?

Qualquer abordagem ao surgimento de um movimento como o Gótico, carece a meu ver, de uma abordagem histórica, no intuito de identificarmos as origens, os ideais e as causas que nos permitam uma melhor compreensão da temática que abordamos.

“Conhecer uma palavra desde sua origem é como conhecer uma pessoa desde pequena.”[1]

Uma abordagem etimológica à palavra Gótico ou em Inglês Goth remete-nos para a tribo germânica dos Godos ou Goth´s, este povo germânico que habitava a Escandinávia, começou em meados do século II a realizar incursões militares para lá das suas fronteiras, em direcção a territórios do império Romano de Marco Aurélio através do rio Danúbio. No século seguinte, foram várias as incursões, ataques e saques às províncias de Anatólia e toda a península balcânica. A Costa Asiática e o Templo de Éfeso foram vítimas da fúria dos Godos. Já sob o reinado de Aureliano (270 - 275), Atenas foi invadida e seguiram-se a tomada de Rodes e Creta. Os romanos foram expulsos de Dácia, e os Godos instalaram-se definitivamente na região do Danúbio. Assim de acordo com a região ocupada, os Godos foram denominados também de Ostrogodos e Visigodos. Apesar de extintos no século VIII os feitos e conquistas deste povo deixou marcas, a queda do império Romano para a qual os Godos contribuíram largamente, a destruição de inúmeras construções Greco-romanas, terão criado uma conotação pejorativa que foi passada de geração em geração. Deste modo com o renascimento classicista do século XVI, o termo Godo terá ficado associado a inculto ou destruidor de arte clássica, e sob a sua forma pejorativa o termo Godo passa a ser utilizado para, classificar a arte Cristã da idade média período em que a Igreja absorvia a estética pré-cristã da região onde se instalava, chegando mesmo a absorver certas características pagãs.
Assim, analogicamente, este estilo arquitectónico predominante durante séculos, caracterizado pelos imponentes vitrais e gárgulas, passou a ser considerado pelos italianos, o "povo bárbaro" que "invade" o "povo clássico-cristão", tornando impura a arquitectura cristã da época.
A grande intenção era vulgarizar todo o estilo, mas nos séculos posteriores, o termo "gótico" acabou associado ao obscurantismo medieval, fincando deste modo, raízes permanentes na Europa.[2] Esta que apresento é a versão mais usual e coerente de acordo com os historiadores, da palavra Goth, no entanto Fulcanelli, alquimista cuja verdadeira identidade permanece desconhecida, afirmava que o termo Goth seria uma deformação fonética de Argoth (ou Art Goth), uma linguagem restrita utilizada somente por Iniciados em Ocultismo. Embora historicamente essa versão seja incoerente, é uma visão interessante.
Já mais tarde durante os finais do século XVIII princípios do século XIX, surge na Alemanha o movimento filosófico, literário e artístico, que chamamos de Romantismo, será correcto afirmar que o romantismo surge em parte, como reacção ao culto da razão dos iluministas, mas numa lógica de coerência voltemos à etimologia no que se refere ao romantismo, isto é o “adjectivo "Romantic" é de origem inglesa, e deriva do substantivo "romaunt", de origem francesa ("roman" ou "romant"), que designava os romances medievais de aventuras. Depois a palavra generalizou-se a tudo aquilo que evocava a atmosfera desses romances (cavalaria e Idade Média, em geral). No séc.XVIII Rousseau (filósofo da revolução francesa) distinguiu "Romantique" (romântico) de "Romanesque" (romance)”[3], o romantismo envereda por uma procura das fontes e origens nacionais, em oposição ao universalismo classicista, a uma importância acrescida dos sentimentos, como força legitimadora da acção humana, a um irracionalismo consciente, ao amor platónico, obscurantismo, pessimismo, aos ideais do fantástico e a um certo misticismo, os românticos procuram então um regresso ao passado, que se traduz num revivalismo neo-gótico, idealizando uma idade média, um tempo medieval que comummente chamamos de idade das trevas, neste período o termo gótico passa a designar uma corrente literária aplicado como sinónimo de medieval, sombrio, macabro e por vezes, sobrenatural. As expressões Gothic Novel e Gothic Literature são utilizadas para designar este subgénero romântico, que trazia enredos sobrenaturais ambientados em cenários sombrios como castelos em ruínas e cemitérios. Assim, o termo Gothicism, de origem inglesa, é associado ao conjunto de obras da literatura gótica, esta corrente inicia-se provavelmente com a obra O Castelo de Otranto (1764), de Horace Walpole, surgem em seguida muitas outras obras que são colocadas neste género literário, The Old English Baron, a gothic story (1777), de Clara Reeve, The Recess; or, A Tale of Other Times (1783-1785), de Sophia Lee, e Charlotte Smith, autora de Emmeline: The Orphan of the Castle (1788), também ajudaram a construir o romance gótico. Na década seguinte Eliza Parsons lançou The Castle of Wolfenbach (1793) e The Mysterious Warning (1796), Regina Maria Roche escreveu Clermont e Eleanor Sleath, poderíamos continuar a identificar indefinidamente obras e autores desta corrente literária, mas vamos apenas destacar aqui, mais duas obras marcantes, já no século XIX Mary Shelley escreve Frankeisntein (1820) e Bram Stoker escreve em 1897 Dracula.[4]
Posteriormente, influenciado pela Literatura Gótica, surge o ultra-romantismo, um subgénero do romantismo que tem o tédio, a morbidez e o dramatismo como algumas das características mais significativas.

“Durante o primeiro período da Renascença, os ricos (e portanto os instruídos) vestiam-se com trajos extravagantes e ostensivos feitos com fortes e caros tingimentos coloridos, e decorações douradas e prateadas. Na primeira metade do séc. XVII, à medida que a Renascença se ia espalhando até à Europa do Norte, os holandeses inventaram os primeiros tingimentos permanentes de cor negra. Nesta altura, os mercadores holandeses substituem os italianos, enquanto principais mercadores, e Amesterdão torna-se o centro de poder e conhecimento na Europa – eram então, os cidadãos mais letrados da Europa.
Os mercadores holandeses introduzem então o café e o chocolate na Europa que se tornam a grande moda entre os mercadores ricos e instruídos, e os artistas que eles sustentavam, que se reuniam em casas de café todos vestidos de preto a beber café e a comer chocolate. Ainda hoje existem em Portugal, casas de café que oferecem um pequeno chocolate para acompanhar a "bica" ou o "cimbalino". Johann Sebastian Bach, que passava bastante tempo em cafés a conviver e a improvisar música com os seus contemporâneos, escreveu mesmo a "Cantata do Café" sobre uma mulher que queria beber café apesar da oposição do seu pai, defensor de normas morais da época, que restringiam o acto de saborear esta bebida aos indivíduos do sexo masculino.
Enquanto os estilos foram mudando entre os ricos e os poderosos, o estilo e a imagem do artista e/ou intelectual trajando de negro persistiu mesmo até aos românticos do séc. XIX, e mais tarde aos primeiros artistas avant-gard do séc. XX. Os intelectuais de Weimar tais como os fundadores da Escola de Bauhaus (Escola de arte de Vanguarda), continuaram a tradição, levando directamente à chamada Beat Generation à qual os Góticos actuais foram buscar elementos que transmutaram para a sua cultura.”
[5]

É já durante o século XX no final da década de setenta que o termo Gótico volta a surgir, a subcultura gótica influenciada por várias correntes artísticas, como o Expressionismo, o Decadentismo, a Cultura de Cabaré e o Beatnick, inicialmente a mesma surge com uma expressão do movimento Punk, os seus adeptos foram inicialmente apelidados de Darks, é interessante verificar que em termos musicais, a primeira banda rotulada de Gótica terá sido para muitos os Bauhaus, (digo interessante dado o nome nos levar directamente ao movimento vanguardista Bauhaus) embora bandas como Joy Division já tivessem chamado a atenção deste sub-movimento Dark dentro do Punk, é com Bauhaus e nomeadamente com o tema Bella Lugosi is dead [6] que em termos cronológicos surge o movimento Gótico, esta é uma posição partilhada pela grande maioria dos membros do movimento gótico, no entanto sabemos que é sempre difícil traçar com exactidão cronológica este tipo de acontecimentos, existem de facto posições divergentes, Marion Philips diz-nos o seguinte “Do Punk Rock dos anos 70, floresceu uma das melhores bandas de rock de sempre, Siouxsie & The Banshees, que, segundo algumas opiniões criou a sonoridade do Goth Rock, no seu álbum "Kaleidoscope”, de 1980. Três bandas constam das influências das modernas bandas associadas ao estilo Goth, são elas: Velvet Underground, Doors (provavelmente a primeira banda de rock a ser apelidada de Gótica, pela imprensa) e Black Sabbath. A origem da denominação Goth Rock tem duas possíveis origens: alguns dizem que o termos foi pela primeira vez empregue pelo manager de Joy Division, Tony Wilson, para definir o estilo da banda; Outros dizem que a sua origem deve-se a Siouxsie Sioux. Contudo há ainda outra origem plausível, que deriva da música "Bela Lugosi's Dead", de Bauhaus, que é do ano 1979. Nas décadas de 80 e 90, muitas bandas tornaram-se famosas pela sua sonoridade e o estilo acabaria por sair da Europa e ser adoptado em todo o Mundo. Na Literatura e no Cinema, os mitos tradicionais foram reformulados por autores como Stephen King e Anne Rice e por filmes como Friday 13 e Fright Hour"[7]. De facto existem dificuldades em traçar uma linha de acontecimentos cronológicos precisos, no entanto as dificuldades não se esgotam no enquadramento cronológico/histórico, uma vez que qualquer tentativa de definir o movimento Gótico em si, mergulha num oceano de subjectividade, ideologias díspares e heterogéneas. Vejamos o que nos dizem José Carlos Bento de Carvalho, e Nuno Miguel Nunes Dionísio autores de uma tese sobre o movimento Gótico:

Antes de mais, é importante referir que o Goth, logo a partir de 1981, distinguiu-se em duas facções: uma denominada de Apolínea, e outra, Dionísiaca. Os primeiros mostravam-se especialmente preocupados com as facetas artísticas e filosóficas do Goth, sendo facilmente percepcionados como "mórbidos" mas "inofensivos", pois evitam gerar conflitos com a cultura vigente. Pelo contrário, a segunda facção, adoptou posturas assumidamente contra-culturais, e confrontacionais nas suas formas de expressão, sendo percepcionadas como auto-destrutivas e "perigosas", aos olhos das estruturas cognitivas da sociedade. A esta facção, pertencem os músicos e os mais variados artistas, e líderes de pensamento do movimento Goth. O estereótipo de gótico nos nossos dias, tem mais a ver com a facção Dionisíaca, caricaturada mediáticamente numa imagem de decadência em torno da auto-destruição, ignorando a componente artística característica intrínseca e inalienável do movimento.
Em 1987, a separação entre as duas facções foi-se esbatendo (18) à medida que os seus membros entravam no mundo laboral e tiveram de se conformar com as consequências do seu estatuto de adultos, condição indispensável para a sua sobrevivência. Entretanto, uma nova geração de jovens com tendências Dark aparece, a qual segue as pisadas da facção Dionisíaca, revendo-se no modo de sentir desta, sobretudo nas músicas, nos seus modos de vestir alternativos, etc. Estes novos membros do Goth, foram desaprovados pela "escola antiga" da comunidade Goth. A alguns membros desta segunda geração, foram-lhes aplicados os rótulos de "falsos góticos" ou "weekenders", por apenas darem importância ao modo de vestir, considerando-os "vazios", "sem conteúdo", "drogados". Na prática, reacenderam o movimento nos princípios dos anos 90, cujos códigos (de vestuário, de modos de pensar e agir) foram reaproximar-se da primeira geração.”
[8]

É no sentido de fazer incidir alguma luz sobre as dimensões que caracterizam o movimento Gótico contemporâneo que dedicarei este trabalho. Para tal, e no sentido de realçar a importância de um estudo sociológico no que se refere ao Gótico, irei privilegiar a importância da construção social da identidade, ciente que tal demonstrará o quão difícil será uma análise ao gótico, fruto da subjectividade que os actores tendem a atribuir ao seu discurso no que se refere ao movimento gótico Português.

Olhar sobre uma perspectiva sociológica.

Estudos sociológicos anteriores, à temática que aqui abordamos são escassos, de facto após uma longa pesquisa no universo de estudos produzidos em redor do gótico, tive a oportunidade de encontrar apenas uma tese de licenciatura da autoria de José Carlos Bento de Carvalho e Nuno Miguel Nunes Dionísio, intitulada Goth – O Ultra-Romantismo Juvenil em Lisboa: um estilo de vida alternativa[9], no entanto a orientação teórica seguida nesse estudo não nos dá conta do que realmente aqui queremos saber, no entanto as contribuições do mesmo são importantes no sentido em que nos apresentam o gótico como um movimento “O nosso objecto de estudo, não revela tendências de participação social. Mas esforça-se por manter os seus locais - espaciais e simbólicos - de apropriação, onde produz e reproduz as suas representações, desenvolve as suas práticas, e revigora os seus laços sociais, enfim, onde reforça a sua identidade. Segundo D. Mehl, há hoje uma valorização do indivíduo, da família e dos grupos de afinidade em detrimento das classes sociais e dos grupos profissionais (posição em tudo semelhante à de Mafesolli). É então um contra-sistema na medida em que põe em causa alguns dos valores centrais das sociedades contemporâneas (...) Face ao exposto até aqui, consideramos o Goth como movimento social porque: tem maior duração que as explosões colectivas; os actores têm condições semelhantes, agregam-se em torno de uma identidade; têm uma componente claramente contra-cultural e logo uma oposição; esse contrapoder é simbólico, pois a ruptura com o instituído dá-se ao nível das representações colectivas (laço moral); os laços morais e sociais e as subsequentes acções, estabelecem-se fora das instituições estabelecidas”[10] outro contributo importante deste estudo refere-se à construção de uma identidade, não que este estudo seja conclusivo ou até mesmo explícito no que se refere a esta dimensão, nomeadamente a caracterizar essa mesma identidade, mas porque nos apresenta parcialmente um de dois processos chaves na produção de identidades sociais, como nos diz Madureira Pinto “... a produção de identidades sociais implica a imbricação de dois processos: o processo pelo qual os actores sociais se integram em conjuntos mais vastos, de pertença ou de referência, com eles fundindo de modo tendencial (processo de identificação); e o processo pelo qual os agentes tendem a autonomizar-se e diferenciar-se socialmente, fixando em relação a outros, distâncias e fronteiras mais ou menos rígidas (processo de identização) ”[11] o que quero aqui referir é que os autores do estudo que aqui refiro, dão-nos conta do trajecto que os actores seguem para aderir ao Goth, o que é bastante pertinente se tomarmos em consideração as afirmações de José Machado Pais “As ciências sociais exploram muito o “objectivo” e o “subjectivo” mas muito pouco o “trajectivo” – feito de contactos, aproximações, deambulações”[12] o que os autores nos dizem em relação aos trajectos do actores, na sua adesão ao Goth é o seguinte:

“Verificamos que os membros deste grupo juvenil, partilham um percurso idêntico nos aspectos essenciais. Embora existam algumas nuances, estas não revelam disparidades que ponham em causa a sintonia, pois estão relacionadas com a criatividade individual no interior do estilo de vida Goth – aliás, extremamente valorizada dentro do movimento. Através dos seus veículos familiares, o jovem começa a posicionar-se num dado espaço social e é condicionado por uma aprendizagem cujos processos e, consequentemente, cujos efeitos dependerão do meio de origem, ao mesmo tempo que vão repercutir as tensões de uma situação social concreta. Quer isto dizer que os membros da família a que o jovem pertence fazem parte de certos grupos que mantêm determinadas relações com outros grupos — relações, evidentemente, sujeitas a tensões, a alterações (são variáveis as possibilidades de exercer pressão sobre outros ou de ficar sujeito à pressão de outros). A «visão do mundo» transmitida ao jovem e por ele assimilada não deixará de reproduzir as transformações, os conflitos, as contradições que atravessam esse próprio mundo, num dado tempo e lugar.(...) verificámos que a literatura (romântica, poesia, oculto, espiritismo) chega desde cedo ao potencial aderente ao Goth. Em alguns casos, o conhecimento de música ligada ao movimento, faz-se logo a partir da influência dos irmãos mais velhos. É interessante notar que, geralmente, é a mãe, quem faculta aos filhos disposições literárias e religiosas de tendência místicas (muito provavelmente tem a ver com a resistência de características tipificadas femininas, como a sensibilidade e a menor racionalidade; coisas a que o homem não é alheio mas que este hesitará em referir demasiado frequentemente). Opera-se uma discrepância com os pais a nível do capital cultural, quando o indivíduo, mais tarde, ao contactar na Escola, e com os amigos, adquire novos elementos culturais. Os pais desejam que o filho reproduza as disposições anteriormente herdadas no seio familiar e que garantem o sucesso convencional e estabilidade económica. A sua necessidade de se unir a grupos (vem das necessidades ao nível do afectivo, no mínimo, de aceitação; se encontra compreensão, e valorização, ainda por cima num suporte estável – o Goth – tanto melhor) onde os seus valores e preferências sejam compreendidos, leva-o a identificar-se com algumas dimensões de determinada cultura juvenil, integrando-se onde for melhor aceite. Contudo, quando no grupo, o indivíduo não satisfaz as suas necessidades, vai-se afastando gradualmente deste. Estas culturas juvenis, tal como alguns dos nossos entrevistados nos declararam, embora tivessem traços nos quais estes se reviam, impunham determinadas normas informais que revelavam incompatibilidades com algumas das suas disposições. A liberdade de expressão individual, por exemplo, encontrava-se limitada, dentro do modelo de comportamento específico de determinado grupo. Afirmam que sofreram uma "evolução", desde esta fase, até conhecerem o movimento, onde se identificam – onde deixam de estar sozinhos, para conviverem com um grupo que os compreende e que os aceita em pleno, e onde têm uma liberdade de expressão, para serem criativos e aprofundarem as suas especificidades e potencialidades individuais.
Quando conhecem o movimento Goth, identificam-se com este, a partir de diversas disposições que já tinham anteriormente, e que revêem no movimento, partilhando de modos de pensar, sentir e agir, seguem individualmente um estilo de vida apoiado na criatividade e liberdade de expressão pessoal.
Embora possam ter amigos fora da esfera do movimento, afirmam que é no Goth que encontram a solidariedade de gostos e partilha de ideias, sem quaisquer dos constrangimentos que teriam ao divulgar gostos que são tidos como desviantes pela sociedade (impondo-lhes rótulos).”
[13]

Não é de todo a minha intenção dissertar sobre o estudo produzido nesta tese, no entanto achei pertinente, num registo de complementaridade, apresentar o conhecimento produzido pela mesma, seria no meu entender contraproducente apresentar um olhar sociológico sobre o Goth, sem antes dar conta do que já foi produzido. No entanto convém afirmar que após uma leitura da tese, torna-se evidente o caminho seguido pelos autores, que procuram mais trabalhar conceitos como juventude, cidadania e práticas sociais, e não tanto as dimensões do gótico, de facto as referências a tais dimensões por parte dos autores são mais fruto de uma primeira aproximação exploratória e senso comum erudito.

Parece-me então pertinente numa perspectiva sociológica, trabalhar aqui o conceito de identidade, ou seja, definindo como os actores constroem a sua identidade enquanto membros de um grupo, neste caso como constroem a sua identidade enquanto góticos, ou seja utilizando o que nos diz José Madureira Pinto, “é importante não se perder nunca de vista que as identidades sociais se constroem por integração e por diferenciação, com e contra, por inclusão e por exclusão, por intermédio de práticas de confirmação e práticas de distinção classistas e estatutárias”[14] de acordo com esta perspectiva percebemos aqui que a construção de uma identidade social não é linear, e que de facto podemos falar em mais que uma identidade, Claude Dubar diz-nos o seguinte “a identificação utiliza categorias socialmente disponíveis e mais ou menos legitimas a níveis diferentes (nomeações oficiais de Estado, denominações étnicas, regionais, profissionais... até de diferentes idiossincrasias...) Chamaremos de actos de atribuição aos que visam definir «que tipo de homem ou mulher você é» isto é a identidade para o outro; actos de pertença aqueles que exprimem que tipo de homem (ou mulher) você quer ser, isto é a identidade para si”[15] continuando dentro da perspectiva proposta por Claude Dubar temos aqui duas formas heterogéneas às quais algumas teorias sociológicas terão tendência a reduzir a um mecanismo único “o primeiro diz respeito à atribuição da identidade pelas instituições e pelos agentes directamente em interacção com o indivíduo. Não pode analisar-se fora dos sistemas de acção nos quais o indivíduo está implicado e resulta de «relações de força» entre todos os actores implicados e da legitimidade – sempre contingente – das categorias utilizadas. A construção legítima destas categorias constitui um desafio essencial neste processo que, uma vez concluído, se impõe colectivamente, (...) O segundo processo diz respeito à interiorização activa, à incorporação da identidade pelos próprios indivíduos. Não se pode analisar fora das trajectórias sociais pelas quais e nas quais os indivíduos constroem «identidades para si» que não são mais que a história que contam a si daquilo que são”[16] neste segundo processo Dubar utiliza Goffman no que ele chama de “identidades sociais reais” e refere que “estas utilizam também categorias que devem, antes de mais, ser legitimas para o próprio indivíduo e para o grupo a partir do qual define a sua identidade-para-si.”[17]
(A CONTINUAR NUM FUTURO POST)

[1] Schütz, Ricardo. Word histories, disponível em http://www.sk.com.br/sk-hist.html <07-06-2007>
[2] Fonte: Jordanes (historiador godo, autor do livro de Cassiodorus) Tradução de Mierow, Charles. Jordanes the origin and deeds of the goths, disponível em http://www.acs.ucalgary.ca/~vandersp/Courses/texts/jordgeti.html <07-06-2007>
[3] ____. Romantismo. Disponível em http://www.citi.pt/cultura/literatura/poesia/j_g_ferreira/romantis.html <07-06-2007>
[4] Nota: Os textos completos em Inglês, referentes às obras apresentadas, podem ser consultados no Projecto Gutenberg em http://www.gutenberg.org
[5] Carvalho, José. Goth: o Ultra-romantismo juvenil em Lisboa, Trabalho de Investigação para a obtenção da Licenciatura em Sociologia. disponível em http://web.1asphost.com/jcbc2003/goth%20o%20ultraromantismo.htm <02-01-2007z>
[6] NOTA: Béla Ferenc Dezsõ Blaskó, mais conhecido como Béla Lugosi, (Lugoj, 20 de outubro de 1882Los Angeles, 16 de agosto de 1956) Béla Lugosi começou a sua carreira nos palcos da Europa em várias peças de William Shakespeare. Mas no entanto tornou-se famoso pelo seu papel de Drácula numa encenação da clássica história, do vampiro Drácula de Bram Stoker.
[7] Philips, Marion. In Gothic Culture Timeline disponível em http://www.angelfire.com/moon/darkchamber/goth-timeline.htm#12th.goth-timeline <04-05-2007>
[8] Carvalho, José. Dionísio, Nuno. Goth – O Ultra-romantismo Juvenil em Lisboa: um estilo de vida alternativo. Disponível em http://web.1asphost.com/jcbc2003/goth%20o%20ultraromantismo.htm
<17-06-2007>
[9] Tese disponível em http://web.1asphost.com/jcbc2003/goth%20o%20ultraromantismo.htm
[10] Carvalho, José. Dionísio, Nuno. Goth – O Ultra-romantismo Juvenil em Lisboa: um estilo de vida alternativo. Disponível em http://web.1asphost.com/jcbc2003/A%20Soc%20dos%20Mov%20Soc17.htm <17-06-2007>
[11] Madureira P, José. In Revista Crítica de ciências sociais, Nº 32, Junho de 1991, Lisboa. P 218.
[12] Pais, Machado. In SOCIOLOGIA, PROBLEMAS E PRÁTICAS, n.º 49, 2005, P 64.
[13] Carvalho, José. Dionísio, Nuno. Goth – O Ultra-romantismo Juvenil em Lisboa: um estilo de vida alternativo. Disponível em http://web.1asphost.com/jcbc2003/concls27.htm <17-07-2007>
[14] Madureira P, José. In Revista Crítica de ciências sociais, Nº 32, Junho de 1991, Lisboa. P 219.
[15] Dubar, Claude. In A Socialização construção social das identidades. 2º Ed, Porto editora, Porto, 1997, P 106.
[16] Idem, Op Cit P 107.
[17] Idem, Op Cit.

Um comentário:

Unknown disse...

muito bela essa história da palavra gótica^^ estava , justamente procurando algo sobre a transformação do estilo arquitetônico para o literário e então ao movimento atual^^ fiquei com essa dúvida e o post foi muito esclarecedot^^ muito obrigado^^ qualquer coisa com o português por favor não repare , pois sou brasileiro então há algumas diferenças :p